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Indignação tem origem na palavra em latim indignatio, que significa descontentamento, desprezo, uma reação diante de algo indigno, injusto, incorreto. Trata-se de um sentimento que surge como uma reação espontânea frente a uma injustiça, ofensa, afronta ao bem comum ou desprezo à ética social ou praticado diretamente contra uma pessoa, a outros seres do planeta e à própria natureza, ou sentida por empatia a alguém que sofreu um tratamento considerado incorreto.

A indignação sempre aponta para uma reação ética contra atitudes, sejam do cotidiano sociofamiliar ou das relações humanas, em que os juízos de valor revelam a ilicitude e/ou impropriedade de algum tipo de comportamento. Sente-se indignado quando se é vítima de uma ação considerada imoral. Ou seja, a indignação refere-se essencialmente a um conteúdo moral que estaria em jogo: a justiça.

O sentimento de indignação é expresso como uma manifestação humana de descontentamento, por meio de palavras ou atitudes, variando de intensidade conforme o nível de indignação do indivíduo. Mesmo sendo um sentimento espontâneo humano, a indignação pode se manifestar de forma racional, com razão e ordem, mas também este sentimento pode se associar às emoções extremas de ira, fúria ou cólera e até violenta de inconformidade.

Vive-se hoje em circunstâncias nas quais praticamente todos os aspectos da vida cotidiana mantêm uma relação direta ou indireta com a rede mundial de computadores. No entanto, passou-se a viver em tais condições sem muita análise, mudando os hábitos e atividades muitas vezes de forma automática e pouco refletida. Dessa forma, temos o desafio de compreender as novas dinâmicas de vida nesse contexto e desenvolvermos uma compreensão mais ampla de nossas circunstâncias.

A aceleração do desenvolvimento tecnológico que levou a tal estado de coisas estimula uma série de questionamentos acerca de suas possíveis consequências em diversos aspectos, desde temas sociais até questões ligadas ao funcionamento do cérebro e da cognição nas sociedades humanas. Quais são as consequências de interação digital tão intensa? Temos tempo disponível para analisar profundamente seus efeitos? As redes de interação social podem alterar nossos comportamentos?

Diversos estudos sobre o tema apontaram para a existência de efeitos emocionais estimulados pelas mídias sociais, principalmente quando o conteúdo envolve emoções morais. A atual conclusão dos pesquisadores aponta que a utilização de palavras de cunho moral-emocional pode elevar significativamente a redistribuição e replicação da mensagem pelos usuários, aumentando a sua difusão nas redes sociais. De acordo com a análise de inúmeras pesquisas, as emoções morais possuem um papel central na difusão de conteúdo que envolve elementos como raiva, medo, ódio, perdão, amor, bem e outros.

Devido à própria dinâmica das mídias sociais, que ampliam a disseminação dos conteúdos que causam mais engajamento por parte dos usuários, conteúdos que envolvam temas emocionais-morais chamam mais a atenção e são mais disseminados.

Esses espaços de baixa empatia, muitas vezes polarizados e carregados de emoções morais que deixam os usuários pouco receptivos à diferença, passam a ser um ecossistema marcado pelo imediatismo e a reação instintiva.

Em cenários que envolvem postagens agressivas nas plataformas digitais, seguidas de comentários violentos e disruptivos, muitas vezes moralmente carregados (e disseminadas pelas diversas plataformas), os níveis de empatia entre os usuários ficam cada vez menores, criando espaços e territórios em que a interações são cada vez mais homogêneas e sem espaço para o diálogo e a reflexão. A neurocientista Susan Greenfield não nega que as interações sociais digitais também auxiliam na construção de relações sociais que contribuem para a vida das pessoas, mas mostra que os espaços de baixa empatia podem levar ao aumento de tensões e dificuldades sociais, inclusive processos de desumanização e violência.

Segundo Baruch Espinosa (filósofo racionalista holandês, um dos mais importantes da filosofia moderna) não se deve confundir ódio com indignação. A indignação é um afeto ativo nascido da compreensão de que uma injustiça sofrida por outro cidadão diferente de nós, é uma violência que também nos atinge, ao passo que o ódio é um sentimento reativo transformado em vontade de destruir o outro, física ou simbolicamente. Indignação é desejo de construção da justiça, ódio é vontade de vingança. A indignação une os homens na luta pela defesa do que nos torna dignos, já o ódio arrebanha os que fazem da ignorância bandeira e partido. O ódio geralmente se arma com preconceitos, intolerâncias, fake news, ao passo que a indignação se expressa não apenas em passeatas ou manifestos, mas também na arte e pensamento críticos. Enfim, o que caracteriza um cidadão, diz Espinosa, não é exatamente votar ou empreender negócios, mas ser capaz de se indignar com a injustiça sofrida por um outro. Pois não foi a democracia que criou a indignação, mas foi esta que criou a democracia, pois antes mesmo de existirem as leis democráticas e seus tribunais, foi a indignação corajosa de homens libertários que primeiro derrotou a tirania. Indignação não é um ódio ao que é indigno, mas um amor ao que é digno, transformando esse afeto em ação que nos diferencie e agencie coletivamente. O que nos faz humanos é a dignidade, a honra e as virtudes.

Ao contrário da ação virtuosa, vive–se uma disseminação de que se deve criticar, lacrar, e assim se detém muito mais na crítica que na solução dos problemas. E a crítica desta forma, com frequência, não muda nada. Não faz a diferença no mundo.

No momento que nos desapegamos de uma postura de raiva, de ódio e nos dispomos cultivar sentimentos mais nobres, a nos inspirar no que o homem tem de mais puro e permitir a expressão destes sentimentos, há uma transformação da indignação para o ato positivo. Começamos a lutar em nome de algo maior: a dignidade humana. É no nosso eu mais profundo, da nossa alma, como dizia Platão, que devemos buscar inspiração para as nossas emoções, pensamentos e atos.

Como bem explicou Paul Ricœur (um dos grandes filósofos e pensadores franceses do período que se seguiu à Segunda Guerra Mundial), o respeito à dignidade do outro só é possível a partir de um autorrespeito: respeito-me quando sinto que tenho valor. De fato, só nós valorizamos quando nos autoconhecemos: quando é possível refletir sobre as nossas ações, quando somos convidados a pensar sobre nossos problemas, a buscar soluções para os diferentes problemas da vida, quando nos é permitido manifestar o que sentimos diante de uma situação de incômodo, ter nossas ideias e sentimentos considerados. É assim que nos conhecemos. É, portanto, da mesma forma que nos tornamos valorizados, já que o que sentimos e pensamos é tão importante que se abrem espaços para que possamos dizê-los e coordená-los com os sentimentos e pensamentos dos outros em ações efetivas.

Diríamos que a primeira das necessidades é, de fato, sentir-se ter valor, é saber quem somos, já que se atribuir um valor é derivado de se autoconhecer. A segunda dessas necessidades é, em se sabendo quem somos, reconhecer o que é sentido para nossa vida, inserindo nesse sentido o si mesmo e o outro. Se queremos um sentido ético, ou seja, ficar bem por fazer o bem a outro, é com conteúdo éticos que precisamos trabalhar.

A justiça, por exemplo, não se aprende com lições ou teorias sobre o assunto, mas vivendo e praticando relações em que regras são necessárias e respeitadas e valham para todos, em que exista vivência da justiça. A generosidade, outro exemplo, não se aprende com projetos sociais de “dar ao outro o que lhe falta”, e sim com a experiência cotidiana de pensar sobre seus próprios sentimentos e poder ter trocas recíprocas com seus pares para poder, então, sensibilizar-se com a dor alheia.

Se buscarmos inspiração na natureza, eu diria que deveríamos ser como uma rosa, que mesmo quando é colhida e se interrompe o seu alimento com a terra, não deixa de oferecer a sua suavidade, a sua beleza, o seu perfume. Eis a essência humana: a manifestação de sentimentos nobres que nos inspira para uma maior consciência do que somos.



Dr. Carlos Hanzani
Médico Homeopata e Psicanalista

 

 

 

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